17/04/2014 11:06
Alvo de críticas por parte da comunidade de Três Passos, na Região Noroeste do Rio Grande do Sul, a atuação do Ministério Público (MP) e da Justiça no caso da morte do menino Bernardo foi defendida pela promotora Dinamárcia Maciel e pelo juiz Fernando Vieira dos Santos. Ambos concederam entrevista coletiva na tarde desta quarta-feira (16) para explicar o caso.
O menino de 11 anos foi encontrado morto na noite de segunda-feira (14) em um matagal de Frederico Westphalen, no Norte gaúcho, cidade a cerca de 80 km de Três Passos. Ele estava desaparecido desde o dia 4 de abril. Segundo a Polícia Civil, o médico Leandro Boldrini, pai do garoto, a madrasta Graciele Ugolini Boldrini e a amiga do casal Edelvania Wirganovicz são suspeitos do crime e estão presos temporariamente.
Em tom de desabafo, a promotora de Infância e Juventude de Três Passos afirmou que, se essa linha de raciocíno for seguida, muitas pessoas também têm culpa na morte do menino. Segundo a promotora, vizinhos, amigos da família e a comunidade da escola onde ele estudava tinham conhecimento da situação de abandono familiar em que o menino se encontrava, recebendo pouca atenção do pai e menos ainda da madrasta.
“Vocês que dizem: 'Que horror, o Ministério Público não fez nada. Eu digo: 'Que horror que o senhor e a senhora que sabiam disso não procuraram a promotoria e nem o juiz da Infância. Cada um que não nos trouxe essas informações tem um pedaço de culpa no caixão do Bernardo em Santa Maria”, disparou Dinamárcia.
'Ele saiu da audiência se sentindo protegido', diz juiz que manteve guarda
Ao lado da promotora, estava o juiz Fernando Vieira dos Santos. Foi o magistrado quem autorizou no inicío deste ano que o garoto continuasse morando com o pai, após o MP instaurar uma investigação contra o homem por negligência afetiva e abandono familiar. Ele reafirmou que, diante das informações que o MP e a Justiça dispunham na época, tomou a decisão correta.
Órfão de mãe – que cometeu suicídio em 2010, aos 30 anos, segundo a polícia –, Bernardo dizia que era carente de atenção. Ele procurou a Justiça em janeiro passado para relatar o caso. Segundo o magistrado, ele foi até o Fórum da cidade depois de ter sido orientado a tomar essa atitude por um adulto, que não teve o nome revelado.
"Peguei o Bernardo pela mão, descemos as escadas do Fórum, saímos pela rua e fomos ao prédio do Ministério Público. Entramos no gabinete da promotora Dinamárcia. Ele conversou, expôs a situação de abandono afetivo por parte do pai. Ele se queixava de não ter espaço nas atividades familiares, que o pai trabalhava demais, que ele não participava de alguns programas", relatou o juiz Fernando dos Santos.
Ainda conforme o juiz, no dia 31 de janeiro o MP ingressou com o pedido de audiência. No dia 3 de fevereiro, a audiência de conciliação entre pai e filho foi marcada para o dia 11, cerca de 15 dias após Bernardo ter procurado a Justiça. Nesse encontro, o menino e o pai foram ouvidos, primeiro separados e depois juntos. Leandro se comprometeu a dar mais atenção ao filho e também a ajudar para melhorar o relacionamento dele com a madrasta.
“Entendemos que a tentativa de reconstituir os laços seria a melhor medida. Nos disponibilizamos para atender sempre que ele precisasse. Temos certeza de que ele saiu da audiência se sentindo protegido”, ressaltou o magistrado. “Temos então tranquilidade de espírito, de consciência. Era a melhor decisão possível a ser tomada. Não tínhamos nenhum relato de maus-tratos, apenas a questão afetiva”, justificou o juiz.
"Depois disso não surgiu nenhuma informação de que nossa tentativa não estava dando certo. Os relatos eram de que ele era menos visto nas ruas, que tinha mais a companhia dos pais. Ele encontrou a doutora Dinamárcia e disse: 'Olha lá a pessoa que está ajudando a mudar minha vida. Ele declarou: 'Em 90 dias minha vida vai ser diferente'", reforçou Fernando dos Santos.
Velório e seputalmento
O corpo de Bernardo foi sepultado na manhã desta quarta (16), por volta das 10h30 no Cemitério Municipal de Santa Maria, na Região Central do estado. Mo mesmo jazigo está sepultada a mãe dele, Odilaine, falecida em fevereiro de 2010 aos 30 anos. Segundo a polícia, a mulher cometeu suicídio com um tiro na cabeça no consultório onde o ex-marido trabalhava à época.
Na terça (15), o corpo de Bernardo foi velado em Três Passos, no ginásio do Colégio Ipiranga, onde ele estudava. Moradores, professores e colegas de escola foram se despedir do garoto. A notícia da morte dele, após 10 dias desaparecido, chocou e causou indignação em Três Passos.
Durante o velório em Santa Maria, o advogado da avó do garoto, Jussara Uglione, apresentou o atestado de óbito de Bernardo. O documento diz que a morte ocorreu no dia 4 de abril de “forma violenta” e o corpo foi encontrado "em adiantado estado de putrefação". De acordo com a Polícia Civil, o garoto foi morto com uma injeção letal, o que ainda deverá ser confirmado pela perícia. A investigação também vai apurar se a criança foi dopada antes de morrer.
Caso corre em segredo de Justiça
A investigação corre em segredo de Justiça e poucos detalhes são fornecidos à imprensa. Mas de acordo com a delegada Caroline Virginia Bamberg, responsável pela investigação, a Polícia Civil diz ter certeza do envolvimento do pai, da madrasta e da amiga da mulher no sumiço do menino. "Precisamos identificar o que cada um fez para a condenação", afirmou.
De acordo com a família, Bernardo havia sido visto pela última vez às 18h do dia 4 de abril, quando ia dormir na casa de um amigo, que ficava a duas quadras de distância da residência da família. No domingo (6), o pai do menino disse que foi até a casa do amigo, mas foi comunicado que o filho não estava lá e nem havia chegado nos dias anteriores.
No início da tarde do dia 4 de abril, a madrasta foi multada por excesso de velocidade. A infração foi registrada na ERS-472, em um trecho entre os municípios de Tenente Portela e Palmitinho. A mulher trafegava a 117 km/h e seguia em direção a Frederico Westphalen.
“O menino estava no banco de trás do carro e não parecia ameaçado ou assustado. Já a mulher estava calma, muito calma, mesmo depois de ser multada”, relatou o sargento Carlos Vanderlei da Veiga, do Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM). A madrasta informou que ia a Frederico Westphalen comprar um televisor.